Mundo em extinção
Lento observador da realidade que circunda vou dando conta que a blogoesfera portuguesa se reorganiza. Opta agora por juntar-se em blogues multi-disciplinares, onde se movimentam diversas indoles pessoais, embora devidamente enformados politicamente ou culturalmente. Aparentemente tal aconteceu no Verão passado. Os blogues e os blogueres cada vez mais menos anónimos, o que é capaz de querer assinalar que a cidadania lentamente se instala, cada vez mais menos solitários, o que demonstra cabalmente o quão tende para o gregarismo a sociedade humana. A necessidade de sobrevivência (é disso mesmo que se trata) tende para a reunião descartando o individual. Assim pega-se numa qualquer plataforma, juntam-se vários comentadores ou blogueres, misturam-se bem os ingredientes, procurando atrair e fidelizar público leitor como, em outros tempos, o faziam nos jornais. Estes surgem agora como uma espécie de revistas culturais diárias ou não, cuja pretensão última é a de ocupar espaço na rede e redimensionando aqui o papel dos médias tradicionais. Sendo a opção respeitável, não proponho sequer transformar-me num defensor de qualquer tipo de pureza blogo/esférica, nem desta ser guardião, dou contudo nota da evolução. Assinalo-a como um facto de pormenor. Importante para alguns, menos para outros. Contudo reveste-se de alguma importância. Do comentário, à noticia sobre determinado assunto, os blogues colectivos erguem-se como os grandes adversários do jornalismo tradicional, do jornalismo impresso. O filme Stat Of Play onde Russel Crowe protagoniza o velho jornalista de investigação, numa imagem muito estereotipada do fumador inveterado, levemente alcoolizado e genialmente desorganizado pretende mostrar, entre outras coisas mais interessantes, o recente e já à muito anunciado embate entre esses dois mundos, através da ligação com a jovem editora da página on-line do jornal, num esforço último de imagem poética do jornalismo e dos média tradicionais que pretende conjugar dois mundos aparentemente antagónicos. Os blogues, que começaram por ser diário pessoal, por vezes intímo e muitas vezes anónimo, também eles tem os dias contados. A blogoesfera é também ela, cada vez mais, uma máquina onde se pode vir a ganhar dinheiro ou obter algum lucro com uma actividade que começou por ser individual e que o hábito e a qualidade, de alguns dos intervenientes, vão dando fama e proveito. Através desta espécie de revistas cor-de-rosa (estas no formato impresso continuam de boa saúde, como é sabido) onde se procura aliar o útil ao agradável a blogoesfera avança em direcção ao futuro. Mundo onde o individual tem cada vez menos espaço de ser ou de aparecer. Talvez um mundo em extinção. Escrevi talvez. O bloguer solitário é já uma imagem que se desvanece na bruma das novas tendências.