Em Letra Grande
"O estado político é a imagem do estado económico[...]a vida política não existe na classe operária[...] os pequenos proprietários são instrumentos passivos nas mãos dos usurários, os caseiros nas dos proprietários, os jornaleiros dos campos nas dos caseiros e dos proprietários e os proletários das cidades nas dos empresários e das pessoas influentes. Em política a classe operária não passa de um rebanho e ainda que tenha uma profunda aversão por tudo o que toca à política ela deixa-se levar pelo primeiro charlatão que a doutrine. A influência pessoal do primeiro que aparecer que possua uma posição social por mais ínfima que seja faz-se sentir a cada instante. O primeiro trabalho que haveria para fazer seria separar a classe trabalhadora de todos os partidos políticos e destruir os preconceitos que ela tem sobre os homens políticos burgueses e sobre os proveitos que eles tirarão ao ajuda-los a subir ao poder político. A instrução pública é quase nula; os conhecimentos técnicos são frutos proibidos entre a classe operária. Há duas escolas industriais, uma em Lisboa outra no Porto, criadas pelo governo que, não obstante nestes estabelecimentos príbe expressamente a assitência às aulas. No regulamento do Arsenal de Marinha encontra-se a disposição seguinte: Artigo 220: "Não é permitido conceder licenças aos aprendizes para frequentarem aulas públicas durante as horas de trabalho no Arsenal".
O charlatanismo é a condição essencial da nossa política, moral e industrial. À exploração económica junta-se a exploração política e a exploração religiosa. Da nossa constituição política, pretensamente liberla, a classe operária não retirou nenhum proveito, nós não temos mesmo a liberdade de reuniões. Temos duas espécies de escolas socialistas, uma dita popular que prega o socialismo dos economistas burgueses e que pretendeu introduzir entre nós a admiração pelas instituiç~ioes operárias criadas pelos filantropos noutrops países. A classe operária não tem minimamente em conta esta escola. A outra é a dos socialistas políticos que querem chegar a uma revolução económica através de evoluções parlamentares. [...] Assim a classe operária nºão tem qualquer preocupação séria, nem qualquer interesse criado pela classe reinante. Ela possuia apenas uma educação que de dia para dia se modifica."
Lisboa, 15.VIII.1872
Do relatório enviado ao Congresso Mundial de Haia 1872, em Vilaça, Alberto, A Comuna de Paris e a 1ª Internacional revisitadas em Portugal, Lisboa, Campo das Letras, 2005.
Penso que as preocupações da SEDES se prendem com os problemas das classes dominantes e a manutenção do dominio económico e social perpertrado por essas mesmas classes. Em linguagem popular embora possa ser música para os ouvidos de muitos, o discurso deste grupo de reflexão apenas demonstra o medo pela necessária mudança e protege, pretendendo encaminhar, essa mudança.
Como se vê pelo texto de Nobre França, fundador do primeiro, e talvez único Partido Socialista em Portugal, a questão ora levantada apenas ressalva a permanência dos interesses de classe, da classe que os produz. Atente-se na constituição deste grupo de reflexão e tirem-se as devidas ilações.
Diário de Noticias de 1871 foi retirado daqui.